terça-feira, 5 de abril de 2011

As regras do jogo

No jogo do amor, nós fazemos as regras ou elas nos fazem?



Rolem os dados, façam suas apostas. Ok, o papo pode começar com um clima de Las Vegas, mas é o mesmo lengalenga de sempre, ou seja, relacionamentos e suas desgraças. Aliás, falar de jogatina e de relacionamentos no fundo é tudo a mesma coisa, pois o assunto é repl
eto de expectativas, desilusões, perdas eternas, ganhos esporádicos e canalhices casuais. Confesso a vocês que pensando no assunto, adoraria estar escrevendo sobre strip pôquer, mas como tradição, vamos descambar mesmo em mais uma rodada do inconstante e caótico jogo do amor.

Falar em jogo, querendo ou não, sempre vai nos remeter a assuntos como diversão, competição, regras, vícios, perdas e ganhos, sorte e azar. Ironicamente, falar em relacionamentos não vai muito longe disso. Porém, vale lembrar que começar um relacionamento nem sempre é o mesmo que sentar numa mesa de jogo e esperar que a boa sorte nos ajude em nossos lances. (Até mesmo porque, quando se tratava de Banco Imobiliário eu roubava dinheiro do banco pra caralho!)

Relacionamentos não têm regras, mas essa é uma verdade refutada por todos aqueles que entram num. Na realidade, acho bastante interessante a maneira como muitas criaturas tratam o amor e seus desatinos como jogos estratégicos ou de azar. Por essa ótica, fica fácil pensar que várias vezes apostamos e perdemos o coração na roleta da vida, ou então que as coisas não deram certo devido a uma cartada inesperada do destino. (Ou por causa daquele Coringa FDP que apareceu naquela trinca de última hora...)

Alguém um dia deve ter dito (e se não disse, eu me aproprio da frase agora mesmo!) que no jogo do amor não há vencedores, só perdedores. Sei de histórias de cassinos que reservam uma sala especial com um revólver carregado, para o caso de alguém que tenha perdido tudo decida se matar ao invés de sucumbir em dívidas. Não que nos relacionamentos as coisas sejam lá muito diferentes, pois as pessoas costumam perder muito mais do que os seus sentimentos apostados no jogo do "eu te amo".

Mesmo assim, todo mundo vive jogando esse jogo que não tem regras, mas que no final das contas nem é preciso, pois gostamos mesmo é de inventá-las e complicá-las. Aliás, eu que sempre defendi a tese de que os relacionamentos são complicados, me permito a uma contradição: os relacionamentos talvez sejam simples, complicados mesmo são os seres que se envolvem neles. Querem entender meu raciocínio pelo viés da jogatina?

Pensem em um baralho (desses normais, 52 cartas de 4 naipes diferentes). Ok, agora pensem em quantos tipos de jogos você pode jogar com apenas esse único baralho? Centenas. Sim, eu disse CENTENAS. Para se jogar CENTENAS de tipos de jogos, tudo que você precisa é de UM único baralho, desses que você compra em qualquer lojinha ou bazar de esquina. Ora, a vida é assim: ninguém fica só no Pif-Paf, Dorminhoco, Buraco e Paciência para sempre. Pensando bem, no "Dorminhoco", "Buraco" e na "Paciência" muita gente fica por longos tempos... (Ai, que trocadilho podre! Morra, Sr. Apêndice, morra...). De qualquer maneira, haja desocupação nesse mundo para se inventar tantas regras e métodos para que tudo acabe no costumeiro "você perdeu, eu ganhei". (Sempre me pergunto por que as pessoas inventam maneiras de complicar tanto às coisas ao invés de apenas simplificá-las! Eu, por exemplo, daria o prêmio Nobel àquele ser que inventasse um pão de cachorro-quente que não fizesse a salsicha escapar enquanto tentamos mordê-la...)

Evidentemente, em certos jogos vencer ou perder não é o principal, como nos falam os técnicos frouxos e pseudo-sábio
s de filmes de superação de Sessão da Tarde (daqueles de roteiros clichês em que o time perde o tempo todo, mas que no final consegue uma vitória emocionante e milagrosa); "o importante mesmo é jogar e se divertir", eles repetem todo o tempo. Piegas ou não, foi através dessa fórmula que a indústria do videogame ficou milionária. De certa forma, esse poderia ser o caso dos relacionamentos, mas isso seria um tanto óbvio. Afinal, por mais que a adrenalina, o risco, e a expectativa do resultado incerto nos conduzam, acredito mesmo, como falávamos anteriormente, que inventar regras parece ser um dos motivos mais estimulantes para todos que se envolvem e embarcam em uma relação. Estimulantes não, penosos, se me permitem a retificação.

É aquela velha história, tipicamente ilustrada pelo caso de duas pessoas que recém se conheceram e resolveram entrar no jogo da conquista. Eles trocam o número de telefone, MSN, Orkut, Facebook, Twitter, Skype e sei lá mais o que, mas no fundo eles querem mesmo é trocar saliva e fluídos. Logicamente, eles não podem dar seus braços a torcer, pois nada pode ser tão fácil e simples como se supõe. Logo, eles resolvem criar as tais regras e complicar tudo. Ele poderia ligar para ela a qualquer hora, convidá-la para sair ou simplesmente pergunt
ar "como foi seu dia". Mas é claro que ele não vai fazer isso. Esperar pelo menos dois dias para entrar em contato e criar um clima de mistério são as suas regras. Aí, ao invés de ligar, manda uma mensagem de texto "despretensiosa", tentando mascarar seu óbvio interesse com palavras minuciosamente selecionadas, pensadas e repensadas várias vezes. Enquanto ela não responde, ele padece sobre o interlúdio torturante do tempo de espera. Mas tudo bem, ele fez a sua jogada em seu turno.

Ela, por sua vez, poderia
ter feito o mesmo que ele antes. Sabe-se lá quantas vezes já fuçou e espiou o Facebook e Twitter dele com o intuito de descobrir algo, mas se conteve a entrar em contato e acalmar sua ansiedade pois estava jogando de acordo com as regras daquela disputa. Por tradição, era o celular dela que deveria esperar a primeira chamada, e não vice-versa. E aí eu pergunto a vocês, estratégicos leitores: qual a finalidade de tudo isso? Alimentar as expectativas, adiar uma desilusão inevitável ou simplesmente jogar de acordo com as regras desse jogo, ridículo se pararmos para analisar. Mais uma vez, façam suas apostas...

Também já vivi e presenciei relacionamentos que mais pareciam um jogo de xadrez, pois cada lado calculava seus próximos passos na relação com tanta cautela e estratégia que fariam um enxadrista profissional parecer um afobado. Um lado não dizia nem fazia nada enquanto o outro não fizesse nem dissesse o mesmo, como se ambos estivessem sempre jogando pelas falhas alheias. Se um sentimento fosse revelado, ou escapasse sem querer pelo calor da hora, o risco era o mesmo que entregar uma torre para um peão, pois nunca se sabia qual seria a jogada que o outro lado estava a tramar. No final, o xeque-mate tão temido por ambos os lados era dispensado, pois o jogo acabava com a desistência mútua, pois jogar em uma relação pode ser também muito exaustivo e decepcionante. Olhando o tabuleiro abandonado com as peças desordenadas por horas de um jogo frio e calculista, o substrato da relação acabava pelo repúdio a tantas regras e pela inconformidade de tanto tempo perdido. As peças não tombaram tampouco as regas criadas em nome da partida, justamente ao contrário dos sentimentos de seus jogadores.

Normalmente nos relacionamentos, se você não dá um xeque-mate nas regras, elas dão um xeque-mate em você. Não existem apostas ou estratégias mirabolantes nessa hora. Nunca ninguém questiona os reais motivos pelos quais devemos agir de acordo com esses regulamentos, pois no final das contas, as únicas arbitrariedades que valem no campo dos sentimentos, são aquelas apitadas por nossos próprios corações. Drástico, mas tememos os cartões vermelhos mesmo sem termos entrado no jogo para cometer algumas faltas. "É amigo", como diria o insuportável do Galvão Bueno, "Copa do Mundo..."

Por deboche do destino, enquanto o mundo girar, a roleta dos sentimentos vai fazer o mesmo. Da mesma forma, os relacionamentos ainda vão ser as partidas favoritas daqueles que buscam completude sentimental, emoções, e altas doses de adrenalina no tabuleiro da vida. Preparem-se, pois o jogo do amor sempre será mais apostado que a Mega Sena e mais recorrido do que par-ou-ímpar. As regras seguirão sendo inventadas, modificadas e readaptadas, mas isso faz parte se queremos entrar nessa jogatina, em que ganhar ou perder fica só por nossa conta e risco. Afinal, se precisamos e inventamos as regras, é devido ao medo de enlouquecermos nesse jogo. As regras nos enganam, pois com elas pensamos que estamos fazendo às coisas certas. Ganhar ou perder, não importa, nós, meros mortais, vamos apenas seguir jogando, pois a banca do cassino das ilusões nunca quebra. Então senhoras e senhores, façam suas apostas e que rolem os dados...