A crônica de hoje fala sobre uma das melhores coisas da vida: a solteirice! Entraremos hoje no mundo daqueles que apreciam a sensação de estarem livres, que vivem bem com o descompromisso e que levam a vida "soltos", como o próprio termo "solteiro" remete. Desta vez, cantaremos juntos aquele "xa la la la la la" do "sou praiero, sou guerreiro, tô solteiro, quero mais o quê?".
Ok, eu sei que nem tudo na vida é festa, principalmente quando se trata de relacionamentos. Muitas vezes o status de solteiro não é bem recebido por alguns que preferem tratar essa bendita condição como um calvário de Sexta-Feira Santa. Muitos enxergam a solteirice como uma forma de solidão ou como um jeito de estar desesperado por um relacionamento.
Logo, pensando bem sobre o tema, percebi que existem mais tipos diferentes de solteiro do que bombons numa caixa de Especialidades Nestlé. Enquanto uns aproveitam a vida de solteiro à procura de alguém, outros fazem dela um escudo para se defender de qualquer tipo de relacionamento. Uns amam tanto a solteirice que não a querem deixar de jeito nenhum, enquanto outros a abominam tanto que mal veem a hora de estarem engajados numa relação de uma vez!
Para minha surpresa, a condição do "ser solteiro" se apresentou diante dos meus olhos com um fascinante laboratório dos relacionamentos humanos. Não que eu seja o Dr. House, mas observando solteiros e solteiras que andam por aí, descobri várias características, sintomas e causas da solteirice. Aliás, investigando sobre o fenômeno (nossa, como estou científico hoje!) encontrei tantos perfis de solteiros que daria para fazer uns dez reality shows diferentes.
Então, em primeira mão, o Dr. Apêndice traz a vocês uma lista com diferente tipos e patologias de solteiros. E antes que vocês me perguntem o motivo de escrever sobre tipos de solteiros antes de tipos de casais, eu explico (ou enrolo) o seguinte: para se conhecer num relacionamento, você deve antes saber bem que tipo de solteiro você é. Assim, vamos deixar os diferentes tipos de casais para próxima crônica. Ok, então vamos lá! Pensem que estão assistindo a Discovery Channel e tentem descobrir os tipos de solteiros que há em vocês...
OS TIPOS DE SOLTEIROS
1. Solteiros desconfiados (ou "os decepcionados"): esse tipo de solteiro já levou tanto "na cara" em relacionamentos passados, que após um conjunto de decepções ficou mais desconfiado que o Noé quando viu um casal de cupins entrar na Arca. Ressabiados, e às vezes frios e endurecidos pelas desilusões que passaram, esses solteiros não se abrem mais com tanta facilidade para as chances de se envolverem com outras pessoas. Assim, a solteirice não é bem uma opção - é mais uma forma de proteção. Às vezes podem parecer um tanto pessimistas, pois acreditam que, como eles mesmos gostam de dizer, "os relacionamentos não dão em nada..."
2. Solteiros com assuntos pendentes (ou "os esperançosos"): são aqueles que ainda estão ligados emocionalmente a um relacionamento passado, e portanto vivem na esperança de que a pessoa por quem ainda estão pendentes volte, ou então, que ela desapareça de seu coração de uma vez. Muitas vezes deixaram assuntos mal resolvidos e enquanto eles não resolverem (ou não desistirem mesmo!), seguirão solteiros sem perspectivas de uma nova relação. Quando se envolvem com alguém normalmente é algo superficial e passageiro, até mesmo porque a criatura não para de falar do(a) ex!
3. Solteiros convictos (ou "os anti-relacionamentos"): fogem de relacionamentos como o diabo foge da cruz. Na realidade, esse tipo não consegue se imaginar em um envolvimento mais sério com uma outra pessoa de jeito nenhum. Os motivos pelos quais agem dessa maneira são variáveis e incertos, mas é inegável que eles sofrem de um certo "ateísmo romântico". Anti-relacionamentos acham namoros desnecessários, pois gostam da liberdade de escolha e do descompromisso. Casar? Nem em outra vida. Dessa maneira, a solteirice não é apenas uma opção para esse tipo: é uma convicção quase que fanático-religiosa. Gostam do estilo em que vivem e acreditam na premissa do "solteiro sim, sozinho nunca."
4. Solteiros caçadores (se dividem em dois tipos - "atiradores de elite" e"metralhadoras"): para os solteiros que estão na caça, a vida é uma selva. Assim, esses tipos aproveitam sua solteirice entrando de cabeça no jogo da sedução. Flertar, seduzir e conquistar se torna mais divertido do que efetivamente encontrar um novo relacionamento. No entanto, seus tipos se diferem bem quanto aos seus métodos. Os "atiradores de elite" são mais seletivos. Na caça, observam bem seu alvo antes de dispararem suas artimanhas de conquista, normalmente bem pensadas e adequadas. São reconhecidos pela qualidade de suas caças e não pela quantidade. Já os "metralhadoras" não estão nem aí para o lado em que atiram, sendo que no que acertarem, já era! Preocupam-se mais com a quantidade de pessoas que conseguirem, pouco se importando com a qualidade delas. No entanto, em ambos os casos de solteiros caçadores, uma hora a munição acaba, sendo que aí eles viram alvos fáceis de serem abatidos por um novo relacionamento.
5. Solteiros "tudo é festa": um pouco diferentes dos solteiros caçadores, essa classe acha que tudo é motivo de farra, gandaia e oba-oba! Na realidade, esses solteiros se preocupam mais em curtir o fato de estarem livres e desimpedidos do que propriamente sair por aí caçando outras pessoas. Assim, o importante mesmo é estar no meio do agito, fazendo festa com os amigos e enchendo a cara sempre que quiserem! Normalmente são do tipo que precisam de um relacionamento para se acalmarem, caso contrário, tudo vai virar farra com a galera, desde uma balada até uma ida ao dentista para extrair um dente.
6. Solteiros por falta de opção (ou "os encalhados"): aqui a questão é mesmo a má e velha falta de sorte. Normalmente são pessoas que não tem outra alternativa a não ser esperar pela boa vontade do destino, pois nada do que eles fazem muda muito sua situação. Como baleias encalhadas à deriva, ficam aguardando por uma equipe do Greenpeace para resgatá-los. Além disso, eles podem não ser do tipo atrativo ou interessante, ou não terem nada mesmo que faça a diferença para enfim sairem dessa situação. Para eles, a solteirice pode ser uma bela merda. Muitos tem baixa auto-estima o que complica ainda mais seus casos. A máxima do "sapato velho para um pé torto" é mais que uma esperança para eles: é uma libertação.
7. Solteiros inconscientes (ou "os penitentes"): um tipo complicado de solteiro, pois os que se encaixam nessa categoria costumam ainda ter um namoro ou uma relação que já venceu o prazo de validade. Assim, socialmente eles carregam seus relacionamentos como uma espécie de penitência, tudo em nome do medo de ficarem sozinhos. Dessa maneira, em seus inconscientes, eles estão solteiros, pois o relacionamento que vivem já acabou. Conscientemente, preferem viver uma mentira ao invés de encarar o mundo da solteirice de novo.
8. Solteiros esquematizados (se dividem em dois tipos - "repetecos" e "pseudo-polígamos"): pode-se dizer que esses tipos vivem em um estado de pseudo-relacionamentos, pois eles costumam levar seus envolvimentos com uma ou mais pessoas um pouco mais adiante, porém sem assumir compromisso algum. Solteiros esquematizados são aqueles que sempre que querem tem alguém à disposição. No caso dos "repetecos" trata-se sempre da mesma pessoa. Vivem no limiar entre a solteirice e o relacionamento, e por algum motivo a coisa não engrena. Assim seguem teoricamente solteiros e livres. Os "pseudo-polígamos" vivem na prática algo que socialmente seria quase impossível ou condenável: a poligamia. Recebem o título de solteiros, quanto na realidade eles estão envolvidos com várias pessoas ao mesmo tempo, chegando a agendar turnos e dias alternados para seus encontros. Os dois tipos de solteiros esquematizados são uma mistura de equilibristas com malabaristas, pois fazem truques dignos de circo para conseguirem estar "com" e "sem" alguém ao mesmo tempo. E falando em circo, muitas vezes quem fica com eles acaba fazendo o papel de palhaço(a)...
9. Solteiros "que não sabem ser solteiros" (ou "os desiludidos"): para esse grupo, solteirice é uma coisa vazia ou que já perdeu toda a graça. Ao contrário da maioria dos solteiros, eles não saem por aí caçando ou se divertindo, pois isso já não faz mais sentido para eles. Muitas vezes estão arrasados por um relacionamento passado, e a ficha de que estão de volta ao mundo da solteirice ainda não caiu. Por isso, tudo o que esse tipo deseja é um relacionamento sério, um alguém para viver uma vida sossegada novamente, comendo pizza aos sábados à noite e assistindo Faustão aos domingos de tarde. Porém, enquanto esse dia não chega, eles(as) ficam suspirando pelos cantos, enchendo os ouvidos de todo mundo com resmungos "de como não aguentam mais a solteirice" e repetindo várias vezes o seu desejo obsessivo de ter um(a) namorado(a).
10. Solteiros "há vagas": como os desiludidos, os solteiros dessa categoria estão à espera de um relacionamento sério pois preferem viver um compromisso. No entanto, ao invés de ficarem por aí reclamando da solteirice, os solteiros "há vagas" arregaçam as mangas e vão à luta. Estar solteiro para eles, é estar disponível no mercado atrás de uma relação. Mobilizam tudo o que podem para saírem da situação de solteiros: usam sites de relacionamentos como se fossem catálogos, vão a lugares frequentados por outros solteiros e ainda tiram os amigos para casamenteiros. Só não penduram uma placa de "há vagas" no pescoço por detalhe. Sempre que conhecem uma pessoa nova, já fazem conjunturas pensando nas possibilidades da pessoa em questão se converter em um relacionamento sério.
11. Solteiros sem expectativas (ou "os que não vão para frente nem para trás"): um tipo similar aos solteiros "há vagas", mas bem menos desesperados. Esses solteiros normalmente são pessoas com vários atrativos, mas que se veem numa situação na qual as opções disponíveis no mercado não lhe agradam muito. Para eles, "pessoas interessadas" não é o mesmo que "pessoas interessantes". Às vezes eles podem parecer seletivos demais, mas por outro lado, eles realmente não conseguem se interessar por ninguém. Sem grandes expectativas, eles travam, e "não vão para frente nem para trás". O jeito é esperar até as ofertas melhorarem ou os seus padrões caírem...
12. Solteiros por falta de tempo (ou "os ocupados"): parecido com os solteiros sem expectativas, pois eles também "não vão para frente nem para trás", mas é devido às suas ocupações, sejam elas com estudos, trabalhos, viagens, etc. Para eles, solteirice não é realmente uma opção, é uma consequência de estarem envolvidos com outras coisas e de não terem tempo para se arranjarem.
13. Solteiros "bicho do mato": um tipo chato de solteiro. Vivem reclamando que não conhecem ninguém, que não namoram e etc, mas também não fazem nada para mudar isso. Às vezes sofrem da "síndrome da ostra", se entocam em casa, sendo que ninguém consegue tirá-los de lá. Vivem inventando desculpas esfarrapadas, como a morte do periquito de estimação só para não terem que ir àquela festa e saírem de casa. Por vezes, depois de muita insistência dos amigos, eles finalmente saem da toca, mas aí é uma desgraça. Reclamam de tudo, ficam numas de "quero ir embora" o tempo todo e amarram a cara feito uma criança de castigo. Quando milagrosamente aparece alguém disposto a conhece-los, são mestres na arte de serem desagradáveis com a criatura interessada e afastá-la, seja por sua típica cara de ânus ou por suas grosserias e impaciência. Quando questionados sobre o porquê eles destratam todo mundo que se aproxima, continuam a inventar desculpas, só que agora pondo defeitos na pessoa! Enfim, haja saco para aguentar os solteiros "bicho do mato"!
14. Falsos solteiros (ou "os infiltrados"): esses chegam ao ponto de mentir (principalmente para si mesmos) que estão solteiros só para continuarem agindo como se fossem livres e desimpedidos, a despeito de estarem em um relacionamento. Em outras palavras: são pessoas comprometidas que se infiltraram no mundo dos solteiros. Em meio ao grupo de amigos, os falsos solteiros dizem que estão livres, ou então que seus relacionamentos "estão por acabar". Dessa forma agem como querem, fazem festa e caem na pegação, mas sempre voltam para seus compromissos os quais estranhamente são bem duradouros e consistentes. Os falsos solteiros não devem ser confundidos com os solteiros esquematizados pois ao contrário desses, eles vivem um relacionamento real e recebem o rótulo de compromissados. Ninguém entende como a outra pessoa, suporta a situação do(a) namorado(a) sair por aí vivendo uma vida de solteirice, mas certamente o peso dos chifres já não lhe incomoda mais...
15. Solteiros por um dia: pertencentes ao "casal vai e volta" (que você irá conferir na próxima Crônica do Sr. Apêndice), essas criaturas vivem desmanchando seus namoros por qualquer coisa besta e reatando logo em seguida. Dessa maneira, conseguem viver um ou dois dias como solteiros e graças a esse interlúdio, tiram uma casquinha da solteirice antes de retornarem aos seus relacionamentos. Desconfia-se que o motivo pelo qual o casal acabe e volte a toda hora seja justamente para poderem viver um ou dois dias "oficiais" de solteiros...
16. Solteiros "clube dos solteiros" (ou "capitão do time dos solteiros"): esse tipo de solteiro é uma espécie variante do solteiro "tudo é festa", só que seus sintomas são um pouco diferentes. O que importa para eles é a amizade acima de tudo, e ser solteiro é uma forma de aproveitar a vida e fazer festa com os amigos. Um solteiro pertencente a esse tipo costuma se comportar como um "capitão de time de futebol", pois o que importa mesmo é ter todos os seus amigos jogando unidos pelos campos da solteirice. Assim, sempre que ele sente que um amigo está indo jogar no "time dos casados", ele usa de suas táticas e faz o possível para que o colega não abandone o seu time! Na verdade, o plano desses solteiros é formar um "clube dos solteiros", onde o grupo de amigos não se envolva seriamente com outras pessoas e permaneça assim por muito tempo. Suspeita-se que o "capitão do time dos solteiros" teme muito a solidão ou nunca vai crescer mesmo, por isso fica apavorado em perder seus amigos e suas épocas de farra para a seriedade dos relacionamentos. O irônico é que se um "capitão" se envolve em um relacionamento antes de seus amigos, ele faz de tudo para arranjar relacionamentos para seus companheiros também. Assim, em breve, ele poderá mandar no "time dos casados"...
17. Solteiros com o passe desvalorizado (ou "os por baixo"): houve um tempo em que eles estavam no topo - eram desejados por quem eles desejassem. Quando queriam, não tinham o menor problema em se envolver com alguém, e caso fosse de sua vontade, arranjavam um relacionamento ao estalar de seus dedos. Só que o tempo passou, o dólar caiu e o mercado de ações apontou que o passe dessas criaturas está em baixa. E o pior: a velha e boa fase pouco adianta nesse período de seca, sendo que a solteirice agora não é mais tão divertida quanto antes. Agora esses solteiros vivem numa fase "braba", onde estão matando "cachorro a grito" e torcendo para que a bolsa de valores se estabilize...
Uma ladainha visceral sobre o fracasso em seis atos
(Mas antes, um último gole de whisky. Preciso disso. Não tem whisky? Então vai um vinho doce em garrafa de plástico mesmo. Ok, vamos lá...)
Ato I- "E o amor disse 'Não'"
(Como sempre, tudo começa com um fim...)
Fracassei, mesmo sem ter literalmente fracassado. Quando um relacionamento chega ao final, não se tem realmente certo ou errado, passivo ou ativo, fracasso ou fracassado. Mas há dor, lágrimas e toda aquele blá-blá-blá que todos conhecem. (Suspiro). Vocês sabem, já cansei de falar sobre o fim por aqui. Mas com o fracasso é diferente, pois não se trata de um simples dramalhão com fiascos pela rua e demonstrações públicas de recalque, nem mesmo o típico véu de lágrimas. Não mesmo! Nã-nã-ni-na-não.
Mas, por mais que todo o fim seja um funeral de corações, convenhamos, nessa história de relacionamentos, apenas um morre de verdade. Enquanto quem nos dá um pé na bunda e vive sua "nova fase" (haja cretinice nesse mundo...), nós sentamos na graxa e saímos com o peso do fracasso nas costas. Ficamos com um "se" pendurado no pescoço, refletindo nas eternas variáveis e possibilidades do que poderia ter sido diferente. Mas não adianta, isso no mundo dos relacionamento "non ecziste", como diria o Padre Quevedo. Quando o amor diz "não", não há nada o que se fazer.
Então, se um fim de relacionamento é tomar em nosso oríficio retal favorito, fracassar seria coçar as hemorróidas propriamente ditas. O fracasso é realmente pior, ele é uma desgraça íntima, subconsciente e persistente. Querendo ou não, mesmo exonerados de culpa alguma, somos acometidos a nos sentir devastados sentimentalmente pelo peso do relacionamento póstumo. Saber o motivo, a razão e as circunstâncias do fim, entender o porquê estamos sofrendo daquele jeito não serve nem adianta para porcaria nenhuma. É melhor ir jogar Detetive, e acusar o Coronel Mostarda com a chave inglesa na sala de estar.
Ato II - "Enterrado vivo pelo amor"
(Por que ainda pulsa algo que não existe mais? Ah, não... ainda existe algo! Ou pior: resiste algo ainda...)
Passam os dias, e mesmo após termos tentando, re-tentado, acreditado, re-acreditado, implorado, rezado para todos os santos, Deus e o Diabo, a situação inglória de derrotados em um relacionamento é o que costuma nos esperar. Acreditamos em uma relação, vivemos por ela, e até mesmo, demos um passo maior que as pernas. Por fim, fomos nocauteados por nossas próprias ilusões. Que sina! Encontramos aí o nosso purgatório particular, e de nada adianta pedir por piedade ou clemência. Nem para o citado Padre Quevedo, muito menos para nós mesmos.
Ah... Se há maldições nessa vida, a sensação de fracasso é a maior delas! Maldição perniciosa mesmo, digna de se ser rogada por uma cigana verruguenta de saia poída e com os cabelos fedendo à fritura na beira de uma estrada. Devo ter feito alguma coisa perversa em outra encarnação, digna de fazer o Chico Xavier não psicografar o meu caso. Sei lá, roubei um frango de macumba ou fiz mesmo uma heresia das grossas, como ter estuprado uma freira. Maldição. Repito: mal.di.ção! Mas, pensando bem, isso de um jeito ou de outro pode sempre vir a acontecer com quem está no jogo. Pois, amaldiçoados pelo amor, de uma forma ou de outra, todos nós estamos.
O problema, que detesto falar em voz alta, e que é o substrato da sensação de fracasso, resume-se no fato de que normalmente nutrimos sentimentos por uma pessoa que não está nem aí para nós. Poético, clichê e desgraçado, não? Sim, queremos quem não nos quer mais! É uma explicação cretina, porém real para todo o mal desse fracasso que assola nossas mentes e polui nossos corações. Não podemos fazer mais nada em um relacionamento quando as portas da pessoa alheia se fecham para nós. É assustador, mas trata-se de um funeral para um vivo. É ser enterrado vivo pelo o amor. (Paradoxalmente, sofrer por isso nos faz sentir vivos, enquanto o coração frio da outra pessoa a torna morta... Ok, vamos tentar nos enganar mais um pouco...)
Ato III - "Matando a solidão"
(Deve existir algo que eu possa fazer. Ou talvez 'você'...ou 'você'...)
Dizem os especialistas que o ser humano é capaz de se acostumar com quaisquer tipos de dor. Vi isso em um Globo Repórter, sobre o tema "enxaquecas". Inclusive nesse programa, tinha um velhinho que há 40 anos vivia interruptamente com dor de cabeça, mas já estava adaptado ao convívio com ela. O porquê, como ele mesmo definiu: "eu não tenho dor, a dor é que me tem". Sábias palavras.
Logo, acostumar-se com a dor do fracasso é algo a qual podemos nos habituar. Indiferentemente do tempo que aguentamos com o peso sobre os ombros, é natural sairmos da concha de melancolia em que vivemos, nem que seja para dar uma espiada no mundo lá fora. Afinal, como se não bastasse o título de fracasso, a solidão pode vir a cutucar ainda mais nossa perturbada alma. Ninguém é masoquista ou louco o suficiente de passar por esse período sozinho. (Ou não?)
Assim, independente da constante aflição sentimental a qual estamos condenados, em nome do ego ou dos empurrões dos amigos, voltamos ao jogo, mesmo que o placar da última rodada ainda continue correndo. Dane-se o que sentimos! Ainda temos que transformar oxigênio em gás carbônico e desilusões em mais ilusões. Entramos na onda típica de música do Caetano Veloso, porque se vive numas de "e agora, que faço eu da vida sem você", cujo a solução é "buscar em outros braços seu abraços", etc, etc e tal. (Nossa, por isso que música assim vende!)
Alastrar nosso fracasso, ou mascá-lo silenciosamente, como um chiclete sem gosto na qual insanamente ainda não cuspimos? Dane-se! Talvez funcione tentar dissolvê-lo em novas tentativas de beijar outras bocas! Ou não. Caso não dê certo, ainda teremos garrafas de vodka para beijar nossas bocas. Afinal quem se importa? Quando se trata de um fracasso sentimental, ninguém tem nada a ver com ele, a não ser nós mesmos. E isso é o mais difícil de se admitir. Da mesma forma que ao procurarmos novas pessoas para nos livrarmos de nossa cruz, não estamos "realmente" buscando uma solução. Estamos apenas matando a solidão.
Ato IV - "Arranque as asas de uma borboleta"
(Quem eu estou enganando?)
Ilusões são frágeis. Enganar os outros é algo desprezível, mas tentar nos enganar é algo deplorável. Triste mesmo, como um mendigo esmolando num dia de chuva para fumar uma pedra de crack. Porém, o que são os apaixonados, ou melhor, aqueles que um dia se apaixonaram se não um bando de dependentes químicos, que mendigam por toda aquela sensação inexplicável e insubstituível que é o amor? Você pode se entupir de chocolates, beber litros e mais litros de whisky ou até mesmo cair no desespero de se jogar em diversas relações frugais que não vai adiantar em muita coisa. Tudo fica na volta de procurar as famigeradas "borboletas no estômago". (Ouvi essa uma vez: "e quem quer matar as borboletas no estômago, se elas fazem cócegas para nos rirmos?" - mandei a criatura tomar em sua cavidade anal e me procurar na esquina do inferno!)
O fracasso, uma vez introjetado em nossas mentes, demora para passar. Ele corrói nossas almas, e não há nada a fazer a não ser lidarmos com ele. A bendita salvação não vai vir tão fácil, nem do Céu nem do Inferno, muito menos daquela criatura que você pega todo o sábado em fim de festa. Só cabe a nós mesmos encontrar a solução para nossos próprios corações machucados, mesmo que ela não exista. Até mesmo porque, muitos que se achavam libertos da maldição do fracasso, do nada, entre o café da manhã e o momento de escovar os dentes, perceberam que nada mudou, e que aquele tempo que era para ser a solução apenas adormeceu a dor de não se ter mais aquela pessoa. Irônico ou não, mas da mesma forma que o tempo pode ser nossa solução ele pode ser o nosso carrasco particular. Afinal, nada impede que ele alimente mais nossas ilusões e o nosso sofrimento.
E como todos sabem, iludir-se é sempre um problema, ainda mais no quesito dos relacionamentos. Pois quem sentiu as tais borboletas no estômago uma vez, vive a desejá-las sempre, até mesmo porque elas serviriam para expulsar as traças que andam roendo nosso coração. Além disso, as ilusões são tão frágeis quanto as asas dessas borboleta, mesmo que essa fragilidade seja dura o suficiente para segurar nosso sofrimento... E aí, quem disse que é fácil encontrar a tal paz de espírito? Ok, na dúvida, arranque as asas dessas malditas borboletas agora mesmo!
Ato V - "Além da Salvação"
(... fudeu!)
Passará o tempo e as várias cicatrizes do amor serão como tatuagens, encarnadas em nosso ser. A sensação do fracasso poderá ser atenuada, e talvez você pense que tudo isso não passou de uma parte ruim no DVD da sua vida. Os dias passarão, esporadicamente teremos domingos chuvosos para ficarmos com a frase "que merda!" em nossas cabeças. Claro, algumas distrações nos poderão ser concedidas e talvez tenhamos dias em que uma breve lucidez nos será agraciada. Poderemos rir de nossa própria tolice, e todo o sofrimento e fracasso servirá de experiência para não fazermos tudo outra vez (aham...). Ainda assim, talvez um dia o Restart e o Justin Biber possam vir a morrer em um acidente de pedalinho e você irá pensar: "Nossa, ainda há do que se rir nessa vida..."
Mas saiba desde já que você está além da salvação. Sua redenção será uma mera adaptação de sua alma, que também irá modificar-se após um fracasso amoroso. Você sentirá seu coração se tornando mais duro do que pão de uma semana atrás, e sua coragem, será condicionada por um alarme que apitará como um microondas no momento em que você entrar num ambiente instável dos relacionamentos. Paciência, não há remédio ou salvação para essas coisas. Porque no fundo, nos relacionamentos amorosos, não se trata de descobrirmos "o sentido da vida", mas sim "a sensação da vida".
Eis nossa verdadeira perdição: nossa busca em encontrarmos aquilo, que nem definição deve ter, mas que insistimos em chamar pelo nome da pessoa que nos serve como índice em nossa categoria de decepções amorosas. "Além da salvação", assim é que somos para o amor. Sem mais, nossa ópera parte então para um enfático e sublime final.
Último ato - "Bêbado nas sombras"
(Mais um gole desse tal veneno... Amor? Não, cachaça mesmo!)
Ah, nessas horas, não há muito mais a se dizer. O amor é um desgraçado mesmo, o filho de uma meretriz com gonorreia. Um bastardo cretino! Só ele é capaz de quebrar suas pernas e depois mandar você caminhar. Sim, é bem assim mesmo. (Suspiro.)
E assim a nossa ópera encerra sua ladainha. Afinal, um dia tudo acaba. Relacionamentos, sofrimento, fracassos, amores, a vida... é assim. Tudo vira sombra do que um dia foi. Mesmo que tudo "não termine" literalmente, um dia tudo vira parte do domínio do "já era". E o que ainda pode nos restar é a vodka, que infelizmente, também acaba uma hora ou outra, depois de algumas entonadas. Mas pelo menos nesse caso, você ainda pode comprar uma nova garrafa.
Recentemente fui abordado por uma amiga, leitora do blog, que fitou meus olhos escondidos sob a carapuça amarrotada de papel, e sem hesitar me sentenciou com uma indagação: "E se der certo?". Eu obviamente não esbocei expressão alguma. Como se precisasse. A menina logo seguiu sua argumentação. Disse que gostava das minhas crônicas, achava-as engraçadas, etc e tal, mas que tudo o que ela lia aqui, tratava-se de frustrações, decepções e outras coisas dignas de cortar os pulsos com a faca de serrinha suja de maionese. "Coisas que não deram certo", enfatizava, "nem sempre os relacionamentos são assim".
Expliquei a ela, que sempre foi o objetivo das "Crônicas do Sr. Apêndice" falar das emblemáticas situações desastrosas dos relacionamentos pelo viés do bom humor, sarcasmo ácido e até mesmo por ironias clichês. Uma maneira de rir para não chorar. Ela concordou com cada palavra que disse, atenta como um falcão caçando um rato da pradaria, mas ainda assim repetiu a fatídica pergunta: "E se der certo?"
Por ora deixei no vácuo. Dei de ombros, disfarcei, mudei de assunto e fui buscar uma cerveja. Dois dias depois, estou conversando com um amigo, e para minha surpresa, a mesma inquietação me foi arremessada diante das minhas convicções teóricas. Tentei repetir o discurso. Porém, meu amigo, muito sutil como um rinoceronte sambando em cima de um telhado de zinco, basicamente mandou minhas resoluções, resignações e filosofias acerca das dores de cotovelo mundanas a PQP. Segundo suas concepções, um tanto revoltadas com minha pragmática, que grande sentido existiria no mundo dos relacionamentos se não fosse o objetivo de "dar certo". Ele mesmo, num tom quase drástico, beirando à uma desilusão suicida, disse que já vislumbrava um futuro para ele com apenas uma mulher. Estava cansando dessa história de farra, pegação, troca-troca, putaria e o escambau.
Tudo o que ele queria era a certeza de uma, apenas uma, guria legal, que dividisse uma coberta e uma taça de vinho numa noite fria de sábado, e o tédio amarelado de uma tarde vazia de domingo. Obviamente, me segurei para não mostrar o quão febril suas perspectivas poderiam estar. Sabem como é, todo mundo tem o direito de falar bobagens como se fossem verdades, até porque, enquanto às coisas não viram realidade, até mesmo a lorota da injeção de graça na testa vira a máxima dos pretextos para entramos em qualquer furada. Mas duvido que alguém realmente queira uma injeção na testa, ainda que de graça. Digo o mesmo para a rotina estática e monótona dos relacionamentos. Mas tudo bem, vamos lá de novo: "E se der certo?"
Depois dessas abordagens, fui obrigado a fazer uma reavaliação de conceitos, ir ao fundo do meu consciente. Tal atitude em certas pessoas às vezes é tão escatológica quanto um exame de fezes. Comigo não foi diferente. Ao me defrontarem com o "dar certo", fiquei pensando se as pessoas não estavam me vendo como o nêmesis dos relacionamentos. Por favor, pessoal! Nem tenho ego ou potencial para tanto! Além do mais, acredito mesmo que os relacionamentos possam dar certo, tanto quanto acredito que a Globo não se aproveita dos lucros do Criança Esperança e que a liberação da maconha teria apenas fins medicinais como justificativa.
Assim, reflexivo como um monge tibetano, vaguei dias titubeando sobre a razão do "dar certo". Afinal, por mais desesperado que meu amigo parecesse, e mais convicta que minha amiga se mostrasse, ambos tinham razões suficientes. De nada adiantaria embarcarmos nos tais relacionamentos se não acreditássemos mesmo em um desfecho bem-sucedido para eles. Até mesmo porque, o "dar certo" não é uma questão de resultado, e sim de crença. E de motivação, logicamente.
Em nossas vidas, podemos encontrar inúmeros exemplos daqueles que acharam sua metade da laranja e vivem felizes em seus mundos a dois, e se bobear, na mesma quantidade dos casos infelizes (e por várias vezes, alarmantes) daqueles que sofrem por serem sempre os bagaços cuspidos dos relacionamentos. Mas como somos seres humanos, condicionados a admirar a desgraça dos outros (Datena e Márcia Goldsmith que o digam), normalmente ficamos focados aos infortúnios ocorridos. Assim, alguns calejados pelas desilusões amorosas já encaram certos começos pelo o fim, e começam a eliminar pretendentes apenas por características aparentes e semi-óbvias. (Não duvidem de relacionamentos que não começaram porque a criatura era de um signo do Ar e tinha Mercúrio na Sétima Casa...)
Mas nem sempre as banalidades, casualidades, ou até mesmo os infernos astrais servem para destroçar as possibilidades dos relacionamentos. Muitas vezes eles encontram um modelo de funcionalidade e seguem firmes na luta. Sim, funcionalidade! (E espero que o termo não choque ninguém!). Por mais que esteja dissertando sobre as probabilidades de uma relação dar certo, não ficarei exaltando arroubos de "finais felizes" ou de "mar de rosas". Tudo na realidade, gira em torno de uma questão das coisas funcionarem, das maneiras como as pessoas e seus jeitos, hábitos e defeitos se encaixam. Na verdade, abusando da filosofia barata de boteco, o "dar certo" tem haver com duas espécies de aceitação: 1) aceitar o outro(a) como ele(a) é; e, 2) aceitar a realidade de vida de ambos. Ou seja, tudo se baseia em entender, ou melhor, perceber como o outro é, e enquadrá-lo dentro da sua realidade vigente. Fazer a coisa funcionar é antigir o o tal "dar certo".
Estou complicando? Calma, calma, o titio Apêndice explica. Pensem comigo; você gosta da pessoa, o suficiente para ter sentimentos de completude e paz de espírito com ela. Tudo indica que ali às coisas podem dar certo. No entanto, como em tudo na vida, há detalhes nas cláusulas da pessoa que você gostaria de rever. Você não suporta aquele jeito pessimista dela encarar a vida. Detesta quando ele(a) se acha na razão sobre tudo. Enerva-se sempre que ele(a) te compara com o(a) ex. Aí vem o momento crucial do pretenso relacionamento seguir rodando suas engrenagens. Querer que tudo dê certo é o suficiente? Quais as medidas a serem tomadas nessas circustâncias? Na verdade, é difícil encontrar um eixo para isso. Mesmo assim, metodologias para encararmos a barra não nos faltam.
Costumamos recorrer ao famoso "colocar na balança", mas isso nem sempre é algo adequado, pois infelizmente, para várias coisas da vida, incluindo o coração, não sabemos pesar nem medir. Podemos dispensar alguém em nome de uma mania compulsiva, e depois sentir o golpe em nosso plano sentimental. Também costumamos engolir sapos, tudo em nome da salvação da relação. Porém, ficar acumulando tudo, como um balde de baixo de uma goteira, é loucura digna de internação em um manicômio daqueles fétidos, cheio de loucos com a cabeça raspada e migalhas de bolacha no canto da boca (você já assistiu o filme "Bicho de Sete Cabeças"?). Ainda resta a insensatez de tentar mudar o outro, atitude normalmente sem sucesso nesses casos. Agir dessa maneira insistente e intransigente é assumir um papel desses loucos do manicômio que acabei de citar.
Mas saber conviver e lidar com os defeitos do outro, abrindo mão ali, arregalando os olhos acolá, contando até 10 de vez em quando... bem, isso significa encarar a realidade em nome de um propósito maior. Ah, você não tem saco nem paciência para isso? Sinto muito, mas então nem tente entrar nessa onda do "dar certo". Relacionamentos são exigentes. Afinal, isso faz parte do adaptar-se e evoluir, tão lembrado pelo titio Charles Darwin. A vida é um credor implacável que faz o SPC parecer coisa de criança. E isso não é nem de perto exclusividade dos relacionamentos. Ainda têm os créditos das relações familiares, dos empregos, compromissos e etc e tal. Frente a tudo isso, intolerâncias e birras são tentadoras, afinal, somos humanos, assustados e mesquinhos com o mundo desde o dia em que saímos das entranhas maternas. Não é por menos, que são poucos que tem vocação para ser uma Madre Teresa de Cacutá.
Por isso, volto a bater na tecla de que o "dar certo" não é um final de novela do Manoel Carlos, na qual todo mundo é feliz e termina rindo e com um bebê no colo. Também pode estar bem longe daquelas cenas de "terceira idade perfeita" ("eles tem 70 anos de casados e ainda são malabaristas na cama..."). Não! O dar certo às vezes pode ser conferido pelo tombamento de um relacionamento de anos, no momento em que uma criatura olha para a outra e diz: "não dá mais". Aí a outra, ao contrário do que se pensa, simplesmente diz: "é... não dá mais mesmo! Já deu certo o suficiente..." Depois eles ficam amigos e curtem suas vidas tranquilamente. Vejam como assim tudo funciona, como um intestino depois de uma semana tomando Activia. Mas não é por essas que a vida se encaminha?
Você não tem o carro dos sonhos, mas o seu funciona bem para suas necessidades. Ele anda, te leva de cima para baixo, consome pouca gasolina, tem um IPVA aceitável, e ainda serve de motel de vez em quando. Veja o seu emprego! Evidentemente ele poderia ser melhor, você poderia ganhar mais ou ser mais valorizado nele, porém, ele paga suas contas e te faz sentir-se útil em algo. Bingo, mais um exemplo de funcionalidade. Então, não estaria bom um relacionamento simplesmente para cumprir suas funções, e ser o que em essência todos se propõem a ser, ou seja, uma "relação entre duas pessoas"? Par "dar certo" não precisamos pensar necessariamente em uma história de amor de trama complexa e enredo épico, cujo vilão é derrotado no final, ao alto de um penhasco, e o cavaleiro de armadura brilhante salva sua donzela e cavalga em rumo ao sol poente. Por favor! Se quer drama e romance, assista qualquer novela mexicana chinela que o SBT vive a reprisar. É nessas horas que os simplistas por natureza ou o pessoal que frequenta praias de nudismo saem ganhando: "às vezes, menos é mais..."
Ok, mas a essa altura do campeonato vocês devem estar se perguntando: "mas então, o dar certo tem a ver com conformismo, comodismo e essas coisas assim, que rimam com domingos amarelados?". E eu respondo: sim e não. Tudo depende também do quão camarada o destino pode ser contigo. Ter sorte com certeza faz a diferença para um relacionamento dar certo, assim como em tudo na vida. Mas por ora não se preocupem tanto em buscar essas respostas existenciais ou métodos para uma relação vingar. Preocupem-se com coisas mais simples, como a Declaração do Imposto de Renda ou a prova do ENEM.
Saibam nas entrelinhas necessárias, que o que vocês podem fazer para a dar certo emerge de uma batalha diária contra a rotina e contra as adversidades inevitáveis da vida a dois - o que significa que tudo é variável. Você pode se estressar com a maneira que a outra pessoa masca chicletes ou com suas opiniões políticas, tudo sempre vai depender do autoconhecimento profundo e do esforço constante e estóico daqueles envolvidos na relação. E claro, vale o lembrete clichê: "não basta apenas um querer, para que dê certo..."
No final das contas, o "dar certo" pode ser sempre desvalorizado ou desacreditado por muitos, mas ele nunca será renegado por ninguém. Ele sempre será, mesmo que distante, um objetivo a ser atingido. Para o amor, nada é mais heróico (e insano, claro!) do que pessoas vivendo à procura do outro(a) com o poder de fazer tudo dar certo, e assim, encontrar o sentido da tão almejada felicidade. E por mais absurdo que isso pareça ser, o mundo está cheio de seres que fazem isso todos os dias, e continuam a persistirem inúmeras vezes em busca de sua tampa da panela.
Então, o tal "e se der certo?" não pressupõe respostas. Seja da maneira que for, pelo destino, insistência ou resistência, os relacionamentos acham suas entradas e saídas por si mesmos. Um brinde ao "dar certo", que dá esperanças aos desiludidos do amor, forças aos rejeitados, inspiração aos apaixonados e até mesmo curiosidade aos solteiros convictos. Pois, a despeito de tudo o que digam, há mesmo uma beleza monocromática em um casal desfilando de mãos dadas pelas ruas, crentes que tudo dali para frente pode dar certo para sempre. (Estou me segurando para não rir desse final açucarado, mas juro que não debochei...)
Dei um tempo para o blog. Por vários motivos e desculpas (dá até para incluir a desculpa típica da época: Copa do Mundo, meu amigo...), mas a grande verdade é que "dar um tempo" não é algo que me orgulha muito. Me estressa esses interlúdios desdenhosos, seja em qualquer coisa da minha vida, principalmente nos relacionamentos. Pelo menos para o meu distanciamento blogueiro, minha cara já está coberta com um saco de papel para evitar a vergonha. Porém, na maioria dos relacionamentos, esse não é o caso. Por isso, nada mais justo do que esta crônica refletir sobre o tempo.
Acho que nos relacionamentos pelos quais passei, minhas ex deviam enxergar ponteiros na minha cara, pois elas adoravam essa história do "vamos dar um tempo". O mais inquietante, é que essa ladainha anda bem usual nas relações que existem vida a fora, e é mais comum do que flores, bombons e sentar no sofá domingo com a criatura amada para ver a "Dança dos Famosos" no Domingão do Faustão. (Ok, peguei pesado, sei disso...). Portanto, imaginem (ou relembrem!) o seguinte diálogo diante da "hipotética" situação. Às coisas não vão bem entre o casal, que após dias estranhos, contatos insensíveis e sentimentos de aversão, resolvem quebrar o gelo:
- Então, qual o motivo do silêncio? - diz ele com o oríficio retal na mão, sentindo que a estranheza dela não é TPM.
- Não sei... - ela suspira, implorando que o mundo pare porque ela quer descer.
- É sobre nós? - arrisca ele, se fazendo de monga, mesmo estando na cara que o relacionamento vive um momento "putz, fudeu!". Mas ele não pode dar o braço a torcer. Ou não quer mesmo.
- É... - diz ela, mais escorregadia que sabonete na lendária banheira do Gugu.
- É algo que eu fiz? - ele se culpa, sabendo que isso é o mesmo que uma autopiedade descarada. "Cadê minha mãe" implora, desejando um copo de Nescau e a resolução daquela situação que não vai acabar bem.
- Não, é comigo. - responde ela, merecendo um Oscar por sua atuação de "problemática da relação".
Segundos incontáveis de tensão e suspense ressoam entre os dois. Ninguém tem coragem para dizer ou fazer nada, ambos acuados como em um jogo de xadrez em que qualquer movimento pode ser o diferencial entre ganhar ou perder. Esboçando uma reação, ela finalmente respira fundo, clama por suas forças internas e regurgita incertezas de sua alma:
- Preciso de um tempo! Não tem nada a ver contigo, é uma fase que eu estou passando, e eu preciso de um tempo para pensar melhor nas coisas... - ao dizer isso, parece que ela tira um piano das costas, mas coloca um armário no seu lugar. Seis por meia dúzia, mas pelo menos por enquanto, ela vai se iludir que tem um tempo para respirar antes de ser sufocada pelo enclausuramento das dúvidas. Ou pelo menos, arranjará a coragem definitiva para acabar com a relação. Quem saberá? Ah, e claro, ela deixa uma faca cravada no coração dele.
Ele fica atônito, sem reação. Não sabe ao certo o que isso quer dizer. Olha para ela, quase chorando, mas não faz nada. Ele não pode fazer mais nada, pois é indiferente. Aceita a condição dela, e vai embora cabisbaixo, sentindo que seu coração agora pertence aos embalos dos tic tac's do relógio do tempo...
Para quem já ouviu ou disse a fatídica frase "vamos dar um tempo", sabe que tudo não passa de um eufemismo para "o relacionamento não vai bem, aqui está seu vale transporte para o Fim". É como se a relação estivesse na UTI, respirando só por aparelhos. O caixão já está até encomendado, os parentes chorando, mas quem convalece ainda acredita em milagres. Sabem como é o ser humano, esperançoso por natureza (ainda mais o brasileiro que "não desiste nunca"). Vai que de repente esse "tempo" seja benéfíco e tudo melhore na relação! Primeiro chavão do texto: "sonhar não custa nada"...
Já disse em uma de minhas crônicas, que se a pessoa diz que precisa "de um tempo", ela está sendo educada em dizer que não te quer mais. Os fatores que levam uma pessoa a ficar nessa congestão de ideias emocionais são vários, incalculáveis, bizarros e até mesmo pecaminosos, mas para a pobre criatura que não é relógio, mas mesmo assim tem que dar tempo para um outro alguém, só encontra mesmo dois caminhos a seguir: aceitar ou não o tempo proposto.
Nesse espaço de tempo em que o casal se separa em nome dos sentimentos mais confusos que pode se supor, quem fica "na espera" por assim dizer, declara seu atestado de sofredor. Primeiro, porque essa criatura infeliz não sabe ao certo os motivos que o colocaram na geladeira, ou no banco de reservas dos sentimentos do outro por quem ela ainda nutre grandes esperanças, pois caso contrário um "não dou tempo, vai a merda" seria mais prático e menos insano do que viver essa tortura. Em segundo lugar, e aproveitando o ensejo, já que se falou em tortura, haja limites para os voos que nossa imaginação alça nesse período de indefinição. Nossos neurônios se concentram unicamente em saber o que significa este tempo para a outra pessoa. Vamos da esperança do carnê do Baú da Felicidade até o Inferno astral dos desabrigados das enchentes no Nordeste. Ficamos naquelas: Ele(a) quer cair na gandaia? Na pegação geral? Tirar umas férias de mim? Será que tem outra pessoa na jogada? Tudo vai voltar a ser como antes? Primeira vez sem camisinha engravida? NÃO! Isso, não... Argh! Acho que é menos agoniante fazer gargarejos com soda cáustica.
Tento mas não consigo entender a condição humana (caso tivesse mérito nisso, provavelmente seria laureado em Harvard... ou seria jurado do Ídolos!), mas é impressionante que as mesmas forças que nos fazem suportar situações como essas, não sejam suficientes para pontuarmos os "pingos nos i's" decentemente numa relação. Infelizmente, na maioria dos casos, os sentimentos amorosos (sempre eles...) conseguem nos fazer suportar todos os tipos de sofrimentos e caras arrastadas no chão. Se tem gente louca por aí que mata o filho em nome de uma paixão doentia, então, por essas e outras, esperar no vão do querer de outra pessoa é papinha de bebê. Minha opinião é que o pior ataque é a defesa, mas a melhor defesa é o ataque. Coisa linda seria se alguém a quem foi pedido o tempo numa relação, enchesse o peito de coragem e dissesse na cara da criatura abusada: "seguinte, ou caga ou desocupa a moita!". Nada como dar uma reviravolta no jogo dos relacionamentos, com uma ação digna de autovalorização, afinal, pessoas determinadas tendem a ter a voz de comando numa relação.
Ficar naquelas de "ah, ele(a) não acabou comigo porque tem medo de me perder, por isso pediu tempo... mimimimimimi..." é burrice. E das grandes. Aliás, mais do que isso, trata-se de um convencimento descarado, porque você ainda continua se sentindo como protagonista do filme dessa pessoa, que na realidade está mais a fim de assistir o intervalo comercial. Além disso, vale a reflexão: se você é mesmo tudo isso que pensas que é na vida desta pessoa, ela não precisaria estar dando um tempo na relação de vocês, não é mesmo? Como é mesmo aquele clichê... ah, "quem ama de verdade, não dá tempo." Aham, sei, usei mais uma frase feita, pois tenho mais outra super piegas para completar então: "é pecado ficar desperdiçando tempo para ser feliz". (Bah, me senti usando uma camiseta do Che Guevara , calçando All Star e tomando uma Coca-Cola de canudinho...)
Dar um tempo não deixa de ser a manutenção de uma relação neurótica, cuja ideia de ainda possuir faz com que o outro se ache no direito de interferir em sua vida. Por isso que acabar não é a medida normalmente tomada nessas situações, pois na maioria dos casos, se desprender de alguém não é algo simples, mas é algo necessário. O detalhe é que o peso do finalizar a relação diante da situação do "dar um tempo" deveria ser tratada como uma responsabilidade mútua. Quem quer o tempo deveria ter a coragem de pedir o fim, da mesma forma de quem concede o tal interlúdio. Até mesmo porque, eu duvido que dar um tempo seja um compromisso 100% tácito, da mesma forma que um fim. Ou seja, o sofrimento dá na mesma. Porém, pelo menos terminar é não ter que ficar alimentando a esperança da incerteza.
Talvez a tônica tenha ficado drástica, pois falávamos em "dar tempo" e agora descambamos para um papo de acabar, mas na verdade, tudo isso tem a ver com encararar a realidade. O tempo no final das contas ganha um propósito surrealista de ser um mero artíficio ilusório, uma desculpa efêmera para não tatearmos o real. Se querem se iludir, ou então bancarem os otimistas (como eu, que acredita que vai ganhar na Mega Sena apostando com os números do Lost), prefiram então o lance de acabar para reatar a relação num futuro indeterminado, ao invés de ficarem dando tempo. A princípio vocês podem pensar que se trata das mesmas coisas, mas no fundo a diferença é gritante.
Se vocês estiverem livres e desimpedidos, poderão cair na gandaia, conhecer novas pessoas, e o mais importante é que não terão que prestar contas à ninguém, pois o vínculo foi rompido. É claro que ainda fica o emocional, afinal a relação não acaba literalmente com a verbalização do fim, mas pelo menos as cobranças da volta não serão tão grandes. E se houver as conversinhas moles, e ele(a) chegar com cobranças é mais fácil deixar claro que vocês não tinham mais nada a ver um com o outro. Viu, só como tudo fica mais claro e prático, como "preto no branco", "pão, pão, queijo, queijo"! (E viva os chavões populares!)
Não preciso nem repetir pela enésima vez o quanto relacionamentos são complicados e blá, blá, blá, por isso tentar facilitar às coisas pode ser o verdadeiro sentido da felicidade e da economia em gastos com psicanalistas. Sei que a frase feita do "sofrimento é opcional" é uma das maiores lorotas do mundo, (assim como "Deus ajuda quem cedo madruga" e o "trabalho enobrece o homem"), mas o tal "cortar o mal pela raiz" é uma pérola milenar da sabedoria universal. Então, "deem um tempo" para essa história de "dar um tempo", e enfrentem as formas que seus relacionamentos podem vir a tomar. Nunca é fácil, eu sei, mas caso seja o fim, podemos contar com o tempo, o de verdade, não esse inventado pelos relacionamentos, que na verdade é uma fuga dos fatos. Afinal, como diz o dito popular "o tempo é sábio". AHHHHHHHHHHH!!!! Deu de chavões! Fim. (E não um tempo para pensar em mim, já que às coisas não vão bem entre nós...)
Confesso a vocês que casamento é um tipo de palavra que não me desce. Sério, enunciá-la me causa reações alérgicas bizarras, como brotoejas, náuseas e uma estranha coceira na testa, como se fosse meus anticorpos agindo antecipadamente contra meus futuros chifres. Apesar disso, pasmem, eu sou uma pessoa que acredita no matrimônio, da mesma forma que dou crédito a honestidade dos políticos nos horários eleitorais e que Lost ainda vai ter um remake ou uma versão mais decente para aquele final.Mesmo assim, alguém no mundo, que dita regras invisíveis e intransponíveis (algo digno de teorias conspiratórias ou de malucos com chips na cabeça) diz que nossa escala evolutiva é algo mais ou menos assim: nascer, crescer, namorar, casar, trabalhar, pôr filhos no mundo, trabalhar mais ainda, se aposentar, reclamar da aposentadoria, envelhecer e morrer. "O casamento é uma instutuição falida", esbravejam os revoltados de vanguarda ou os solteirões encalhados. Mas na realidade, a indústria matrimonial vai muito bem, obrigada, rendendo milhões a cada ano, num mercado que vai desde vestidos de noiva até bonequinhos bizarros para enfeitar o bolo do casamento.
Apesar de milhares se separarem todos os dias (sim, a indústria do divórcio também vai bem, obrigada), há pelo menos um dobro de pessoas que pensam diferente e rumam para o altar, a fim de ouvirem um Padre dizer "até que a morte os separe". E qual a razão, motivo ou circustância desse fenômeno? Amor eterno? Filhos gordinhos e rosados correndo na frente da casa? Um jardim de petúnias, uma cerca branca e um cachorro fazendo cocô no gramado? Talvez... mas também pode não ser nada disso.
Casamento é também um negócio, um investimento mútuo de duas pessoas que estão remando contra a maré, pois assim parece ser mais fácil não se afundar no mar das responsabilidades da vida cotidiana. Faz parte (antes dos princípios da "Lua de Mel eterna" e do "café na cama de novela") seguirmos nosso instinto de sobrevivência, pois afinal temos DNA o suficiente para propagarmos nossa espécie por gerações e gerações. Juntar os trapos, fazer um puxadinho, dividir as contas e aguentar diariamente alguém que você escolheu para o resto da vida, parece ser o jeito certo da humanidade caminhar (ou um sacrifício penitente para se conseguir um cantinho no Paraíso) e sobrevivermos mais facilmente. O porquê que às coisas são assim eu não sei, mas quaisquer dúvidas liguem para a condição humana. Tudo o que sei, é que muitos, desde o dia em que nascem, são doutrinados a esse modelo de vida. Pois por mais descrenças que o mundo moderno ainda possa depositar sobre os enlances matrimoniais, ainda existirão aquelas ilusões da vida perfeita, do dia-a-dia dividido com alguém que se ama, de alguém para envelhecermos juntos, etc. Tudo isso soa como um convite tentador e constante na mente das pessoas, ainda mais por elas serem sozinhas em sua essência (e assim sempre será, pelo menos enquanto o cinema seguir produzindo comédias românticas). Além do mais, o casamento sempre será como um escopo de salvação para os problemas humanos. Endividado? O casamento pode ser a sua solução! Case com alguém rico e vá passar a Lua de Mel bebendo um drink exótico no Caribe. Está sendo deportado de volta para o seu país de 3º mundo? Case, e garanta já o seu visto de permanência! Quer uma empregada doméstica, uma amante e alguém para encher seu saco quando você chega tarde em casa? Adivinhem?
E como se não bastasse, ainda há aqueles que creem na utopia de que um casamento pode salvar um relacionamento, porque via de regra é o relacionamento quem dita a salvação para as pessoas. Já ouvi casos de pessoas que disseram: "Eu e a Fulana estávamos quase nos separando, o namoro ia de mal a pior... por isso resolvemos nos casar e tentar deixar às coisas melhores. Aqui está nossa lista de presentes..." (Nem comentarei de novo o quanto o mundo é maluco...)
Todavia, ainda emerge por aí mais uma categoria de pessoas, totalmente relacionadas e focadas à instituição do sacramentado matrimônio: os "eu sou para casar!". Apesar do quanto às coisas andam liberais, das inúmeras farras, estripulias, tequilas e camas estranhas que nos são ofertadas todos as noites, ainda existe uma legião de pessoas que (se) negam a tudo isso. Por princípios morais ou convicções distintas, muitos pensam em serem seus próprios investimentos no pregão da "Bolsa de Valores dos Casórios". Viver uma vida comedida em nome da valorização do passe para o fatídico matrimônio, pode vir a ser um estilo de vida. Parece coisa de vovó, mas ainda existe a tal história do "bom partido". Sim, pois ser um "bom partido" é fundamental para se atrair outro "bom partido"! (pausa para eu respirar fundo e deixar que o enjoo passe...)
O irônico é que nesse esquema de "bom partido" até aquelas habilidades prosaicas ainda são muito valorizadas no pacote pró aliança. Ser bom de cama, bom de papo e bom provedor não é tudo. Ainda tem que saber cozinhar, lavar, passar, costurar, ser alguém legal com crianças, curtir lances família, levar o cachorro para passear e saber abrir um vidro de azeitonas. As pessoas que se dizem "para casar" poderiam ser encontradas em classificados do jornal, tamanha a lista de vantagens e perícias que elas dizem ter. Surpreendente, mas todo o dia vejo pessoas com um reluzente letreiro na testa: "sou a nora/o genro que seus pais pediram a Deus. Quer casar comigo?"
É engraçado pensar nessa ênfase em que as pessoas ainda acentuam nos relacionamentos, como se fosse o destino para todos eles. A pressão social é tão recorrente a ponto de cobranças do tipo "30 anos na cara, e ainda não casou?" serem fortes o suficientes para regerem um caos interno nas pessoas. Afinal, esse alguém misterioso que dita as tais regras invisíveis, é o mesmo que ainda faz com que meninas sonhem com o bendito dia em que entrarão vestidas de noiva em uma igreja, e com que meninos não vejam a hora em que irão tirar esse vestido delas na noite de núpcias. Mas aí, como sempre nos relacionamentos, tudo fica bagunçado. Ser "alguém para casar" não é garantia de nada, muito menos de um casamento! Talvez as culturas orientais que fazem casamentos arranjados quando os noivos ainda são bebês, estejam mais certas, pois eles aceleram toda uma enrolação que só nós sabemos o quanto é agoniante. Ou então é mais fácil seguir o método dos primórdios dos tempos, época em que trogloditas batiam com tacapes nas cabeças das mulheres e as arrastavam para uma caverna.
Bem, mas já que estamos enroscados nessa linha de viver-casar-morrer, agarrar-se ao mantra "sou para casar" pode ser uma defesa, uma crença ou uma esperança. Pois tudo até então, é apenas uma questão de fazer parte no grande tecido das convenções sociais, comprar uma frigideira, um conjunto novo de toalhas e evitar que o mundo exploda. Das incoerências em que somos expostos diariamente, casar não deixa de ser mais uma delas. Mal nos entendemos, vivemos à beira da loucura por estarmos na nossa própria pele, então, vejam a comicidade de querermos a convivência e as responsabilidades diárias com um outro alguém. Talvez comprar uma planta, uma samambaia, sei lá, seja mais lógico.
Posso estar bem errado, mas ainda acho que o romantismo piegas e clichê, aquele mesmo em que o noivo carrega a noiva porta à dentro, não dura muito diante da realidade de calcinhas penduradas nos registros do chuveiro, ou frente a uma discussão pela última raspa de margarina. Mesmo assim, as pessoas ainda irão entrar nesse negócio, fundadas pelas mesmas expectativas e ilusões que seus pais e avós um dia tiveram. Tudo por um monte de latinhas amarradas no parachoque traseiro do carro, com o vidro rabiscado de "recém casados". Vida longa às ilusões, brindaremos aos que "são para casar" pois precisamos ainda dos que se esforçam para verem sentido nisso tudo, mesmo que esse sentido seja embrulhos de expectativas fantasiosas, alheias às expectativas da vida real. Viver por esperar não é tão bom quanto não viver uma realidade por várias vezes frustrantes dos relacionamentos que andam por aí? Talvez, mas vocês sabem como são essas coisas... Esperar um grande momento, uma grande pessoa, uma grande decisão, pode ser tudo apenas uma grande questão de esperar.
Enquanto isso, estou aprendendo a fritar um ovo, descobri que não se mistura roupas brancas com coloridas na hora de lavá-las, instalei eu mesmo um boxe novo no banheiro e comprei cabides e uma samambaia. Ah, já falei a vocês que abro um vidro de azeitonas como ninguém?
Ultimamente, a apêndice que eu nem tenho mais tem doído para burro! Não sei se é porque o tempo anda úmido demais, e aí a gente se apóia nessas crendices de vovós (ai, meu joanete tá me matando, vai cair um temporal amanhã...) ou se é a vida mesmo que anda num arroubo de sadismo, cutucando minha cicatriz cirúrgica só para se divertir. Nesses momentos, desolados diga-se de passagem, minhas opções são poucas: tomar um trago, filosofar e encher o saco. Tudo isso claro, sem o opcional do sofrimento. Por isso caros leitores, eis a hora conveniente de ser inconveniente, e pensar em alguns fatos e verdades do amor e suas relações. Afinal, se cutucam minhas feridas, eu cutuco as dos outros... Então, venham comigo e vamos encarar os fatos nesta lista que fiz:
- Como qualquer história na vida, todo relacionamento tem início, meio e fim. Porém, a diferença está em qual dessas três partes enrolamos mais.
- Só porque a pessoa é legal, não significa que ela esteja te dando mole. Do mesmo jeito, só porque a pessoa está te dando mole, não significa que ela seja legal.
- Quer várias pessoas a fim de você? Então comece a namorar. Não quer ninguém na sua volta? Fique solteiro.
- Redes Sociais não são fontes confiáveis de informação sobre a outra pessoa, mas eles servem como uma fonte de sabedoria e ilusões para nós, quando estamos interessados em alguém. Da mesma forma, eles podem vir a ser tornar mais tarde, nosso instrumento de tortura pessoal favorito.
- O início é a melhor parte do relacionamento, pois nossos cérebros estão reagindo sobre uma overdose de dopamina. Quer manter isso para sempre? Torça para inventarem a dopamina em cápsulas e venderem em supermercados...
- O romance só existe (e resiste) de verdade sob essas três formas: 1) no início de um namoro; 2) pela vontade mútua e divina do casal, e; 3) nos filmes e novelas.
- Falamos que queremos romance, amor por toda a vida, encontro de almas, demonstrações públicas de afeto, etc, etc e tal... mas no fundo, o que queremos mesmo, é sexo.
- Dois corpos só se satisfazem por completo na cama, mas dois corações, só na alma.
- Os opostos se atraem, mas só os semelhantes duram.
- Ficar com alguém só por ficar, pode vir a ser um dos seus maiores erros, e o início de muitas incomodações...
- Não, nem a pau sua namorada vai se parecer com a Juliana Paes ou seu namorado com o Johnny Deep!
- Você acredita em perfeição? Que legal, eu também! Falando nisso, Papai Noel me ligou hoje de Marte e disse que está muito frio por lá...
- Antes de se perguntar se a outra pessoa vale a pena, pergunte se VOCÊ vale a pena...
- Apaixonar-se é como andar em uma corda-bamba: é instável, se cairmos levamos um tombo feio, mas caminhamos rindo como se nada fosse nos preocupar.
- Os poetas do Romantismo afirmaram, depois a cultura pop massificou e por fim os Emos continuaram a encher o saco, mas a verdade é quase irrevogável: "a essência do amor é a dor."
- Em um relacionamento, um vai amar e demonstrar isso mais do que o outro. O problema é quando o que "demonstra mais" não entende isso.
- Pense bem antes de comprar aquele presente caro para a outra pessoa. Nenhuma relação vale o nome no SPC.
- Ninguém gosta nem suporta cobranças. Se é um saco pagar o aluguel todo o mês, o que dirá tentar entender porque a relação não está dando certo...
- Se a pessoa diz que "precisa de mais espaço" ou de "um tempo para ela", ela está sendo educada em dizer que não te quer mais.
- A pessoa por quem você foi trocada pode ser um verme inferior e nem chegar aos seus pés, mas isso nunca servirá como consolo. Afinal, quem foi trocado foi você.
- Ciúmes são tão úteis em um relacionamento quanto pulgas debaixo de um lençol.
- Ah, mas você é daqueles que acha que o ciúmes é o "tempero da relação". Ok, então pense assim: o ciúmes é um tempero, como sal e pimenta, e a relação é uma ferida aberta e ardida. Legal, né?
- Rotina é igual a gente chata em festa: por mais que você se desvie, é impossível fugir dela.
- É possível amar e odiar uma mesma pessoa ao mesmo tempo, assim como pode-se amar e amar duas pessoas ao mesmo tempo!
- A razão pode salvar seu relacionamento, e o sentimento afundá-lo, da mesma forma que o sentimento pode salvar sua relação e a razão afundá-la!
- A pessoa por quem você suspeita que seu(sua) namorado(a) possa estar se interessando normalmente não é o problema. O problema é justo aquela pessoa que você sequer imagina...
- O amor é um escravo sadomasoquista da dúvida.
- Para trair, basta pensar...
- Os relacionamentos amorosos acabam, os chifres sempre ficam. (e os carnês das prestações também...)
- Trair é mais complicado do que você imagina, mas para a outra pessoa é mais simples do que comprar bala na venda da esquina.
- Nunca perdoamos uma traição de verdade. O que pode acontecer, é dizer que perdoamos a pessoa, em nome de uma seca danada que estamos passando...
- A pior coisa de um relacionamento (dentre dos vários piores...) é começar tudo de novo.
- Em todo o relacionamento, quem acaba sempre fica melhor do que você. Fato.
- Dizer "eu ainda te amo", "não sei viver sem ter você", para uma pessoa que acabou contigo não vai comovê-la nem trazê-la de volta. Pelo contrário, ela se sentirá melhor com seu ego elevado e ficará estimulada a continuar sem você. Afinal, ela está na melhor e você na pior.
- É justo quando estamos na pior, quando nosso mundo está desabando e o Diabo nos abana do inferno, que a outra pessoa inventa de acabar...
- O relacionamento acaba, mas o sentimento de posse persiste por mais um tempo...
- Os anos de relacionamento, às coisas incríveis que vocês viveram, as juras de amor eterno, e a dedicação que você teve à outra pessoa, não servirá de nada quando ela dizer: "não te quero mais..."
- Álcool + Recalque + Ex = Merda
- É mais fácil lamber seu cotovelo do que provar para a outra pessoa de que "tudo poderá ser melhor de agora em diante..."
- Recaídas nem sempre significam recaídas. Elas podem ser simples momentos de "hum, será que ele(a) continua na mão...?"
- Para esquecer uma paixão, só se precisa de uma nova paixão. Aham Cláudia, senta lá!
- Em um relacionamento, sempre nos preocupamos mais com o que sentimos do que com o que a outra pessoa sente. Fato.
- No amor, todos os fatos e verdades são previsíveis. Apesar disso, as pessoas continuarão sendo sempre imprevisíveis.
- Por mais inconveniente que todos esses fatos sejam, o mais conveniente a se fazer é não dar bola para tudo isso. Afinal, a vida precisa continuar...
- "Tudo é uma questão de se acostumar com a dor... ou rebelar-se contra ela! Fato."
Neste mundo tem louco para tudo. Uns acreditam que Jesus Cristo voltará em um disco-voador, outros correm maratonas pelados, e ainda há aqueles que elegem um rinoceronte para vereador (se bem que muitos votam em coisas bem piores...). Há bizarrices e absurdos suficientes por aí, e sempre vai haver alguém disposto a testar os limites de nossa imaginação. No entanto, a loucura mais comum e corriqueira que existe, é o nosso desejo latente e constante de eliminarmos nosso senso de racionalidade. No fundo, gostamos de ser loucos, de saborearmos a insensatez, caso contrário não viveríamos arriscando nossa sanidade em nosso anseio vital de nos apaixonarmos.
Paixão e loucura quase chegam a ser sinônimos. Digitem essas palavras juntas no Google, e vocês irão encontrar mais 6.350.000 resultados, que vão desde músicas bregas até histórias de pessoas que literalmente enlouqueceram, e foram internadas em um sanatório por causa de uma grande paixão. Por isso, quando vejo uma pessoa por aí gritando "eu quero me apaixonar", fico no impasse de mandá-la para um psiquiatra ou até mesmo para uma sessão do descarrego da Igreja Universal do Reino de Deus. Mas claro que eu não faço nada, pois também surto desse jeito seguidamente. "Macaco olha teu rabo", já dizia o velho ditado. Contudo, isso ainda não suprime minha convicção básica: apaixonar-se é enlouquecer. Fato.
Sim, pois não consigo ver coerência em desejarmos um sentimento que nos deixa sem o sono, sem fome (anorexicos de plantão não contam), transforma nossos estômagos em uma criação de borboletas e vira nossas vidas de ponta-cabeça. Nossos sentidos ficam anestesiados e nossos corpos totalmente dopados. Agimos como chapados alucinados: nossos olhos só enxergam a pessoa, fruto de nossa paixão, e pensamos nela todo o tempo e em todos os lugares. Nenhuma notícia pode abalar nossos ouvidos, nem mesmo uma catástrofe nuclear ou que Jesus Cristo realmente voltou no tal disco-voador, acompanhado pela Dercy Gonçalves e pelo Michael Jackson. Entramos em realidade alternativa, beiramos entre o patético e a internação psiquiátrica, pois vemos o mundo mais colorido e cheio de coraçõezinhos que um desenho animado dos Ursinhos Carinhosos. Perdemos quaisquer sensos ou noções, pois nosso cérebro fica carregado de dopamina, exatamente igual ao de um dependente químico... Oh, meu Deus! Paixão é realmente uma droga, tão poderosa que é capaz de fazer uma viagem de ácido "das braba" parecer bala de goma.
E como se não bastasse tudo isso, ainda regredimos mentalmente. Estudos comprovam que o apaixonado tem problemas de concentração, raciocínio lógico e dificuldades em aprender coisas novas. Isso sem contar na sua total falta de discernimento perceptivo. Daí a explicação do porquê, uma criatura apaixonada acha os modos daquele peão que arrota e come feijão com as unhas, mais refinados que os de um maître francês, ou então que aquele bagulho desdentado poderia ser estrela de um comercial da Colgate. Para piorar, além da cegueira a qual estamos submetidos, ainda fazemos coisas idiotas, como gastar o dinheiro que não temos em presentes mirabolantes, nos endividar em nome do amor e falar as maiores bobagens do mundo como se fossem parábolas bíblicas. Chegamos até ao cúmulo de achar o cocô do outro a coisa mais cheirosa do mundo. Viramos retardados mentais, inventamos "apelidinhos" gosmentos para o outro como "amoreco", "chuchuzinho", "bebezinhulindu", ou ainda produzimos sons indecifráveis como "tchucthucu" (ai, que ânsia de vômito...). Comprovado pessoal: a paixão nos deixa burros.Contudo, apesar de sermos resumidos a loucos, drogados e burros, ainda persistimos na nossa vontade de vivermos uma grande paixão, e de nos aventurarmos nas berlindas da inconsequência a qualquer custo. Afinal, o que é a estupidez ou a insensatez comparadas a um "eu te amo para sempre"? Assumimos nossa condição de idotas, bregas e piegas, mas por outro lado, temos a certeza de que viver e morrer na razão e na rigidez emocional também não tem graça nenhuma. Até porque nem mesmo um coquetel de Ecstasy, LSD, Anfetamina e suco Golly poderia produzir em nossos corpos as sensações extrassensoriais que só uma paixão é capaz. Sintam isso ao som bate-estaca de um psy trance, e veremos que a paixão é o mesmo que uma rave na alma.Falando em alma, apaixonar-se também não deixa de ser um negócio disputado entre o céu e o inferno, pois nossa felicidade e sanidade dependem essencialmente de uma outra pessoa. Pensem: se ela nos dá atenção, nem que seja um toque para o celular no meio da noite, subimos ao paraíso e curtimos uma festa VIP com os anjos. Caso contrário, se somos ignorados ou esquecidos, dançamos forró nas brasas infernais, tendo o Diabo como DJ. Desespero, agonia, vontade de morrer... ah sim, tudo isso faz parte do contrato da paixão, mas está escrito em letras minúsculas abaixo das linhas pontilhadas, normalmente ignoradas por quem as assina.
Enfim, não tem jeito mesmo. Ainda que existam loucos suficientes para nadarem com tubarões ou para apanharem em casas de sadomasoquismo, eles nunca superarão aqueles que decidem se apaixonar e se entregar às imprevisibilidades de seus cérebros e corações. Muitos podem dizer que "nunca mais irão se apaixonar de novo", mas a verdade é que todos vivem à procura, dia após dia, por todas aquelas sensações arrebatadoras que nos transformam em seres ridículos, retardados e malucos. Então, se alguém hoje me diz "quero me apaixonar", antes de responder "eu também", penso que talvez um "boa sorte" seja mais adequado...
Em todo fim de relacionamento que se preze, sair ressentido não é uma opção, mas sim um acessório do pacote. É aquilo: toda a relação acumula roupa suja o suficiente para transformar o pós-término numa verdadeira lavanderia. Sendo assim, sentir-se ofendido ou indignado com algo que a relação a dois oferece, é mais trivial do que pipoca no cinema. Claro, tem horas em que o relacionamento anda mais por baixo do que tetas de cadela prenha, e qualquer "corno" ou "vadia" viram elogios edificantes.
Porém, mesmo que a situação nunca tenha chegado às vias das farpas verbais e das passagens de ida sem volta aos nossos orifícios retais, com o fim, ainda existirá um sentimento estranho, incomodo como uma unha encravada e azedo como leite talhado. Nessa hora, todo o cuidado é pouco. Podemos fingir que não estamos sentindo nada, deixar essa sensação ir adormecendo e ficarmos mesmo no nível "putodacara" da vida. Ou então, podemos dar vazão a esse sentimento agonizante, e deixar que o lado negro e obscuro que existe em nós tome conta. Estamos falando de liberarmos um veneno dentro de nossas próprias veias, e de abrirmos alas para o carro-chefe de toda negatividade: o recalque.
Em outra crônica falei de como podemos encarar o fim, e ao tratarmos de recalque a questão recai, porém, sobre a forma de como processamos o final de um relacionamento. Para um recalcado, a relação nunca chega ao ponto final, pois ele fica ainda contando as exclamações, interrogações e reticências. Particularmente, não conheço ofensa maior do que chamar uma pessoa de recalcada. Outros insultos viram primários e até infantis, diante do peso moral de sentir a frustração, o ódio e a inveja alheia como um escudo para nossa incapacidade de progresso. Acusar alguém de recalcado é algo realmente perverso. Não é um insulto qualquer, como "broxa", "otário" ou "emo". Dizer: "teu mal é RECALQUE!", é quase uma maldição, é como esfregar fezes quentes de cachorro na cara de alguém. Não é só expor um defeito do outro, é praticamente um convite ao esgoto emocional dessa criatura.
Titio Sigmund Freud explica que o recalque é um problema decorrente da falta de aceitação da pessoa sobre um fato, no caso, um fim. É um trauma que a pessoa guarda no seu inconsciente, que serve como uma autopunição na repressão de seus desejos. Ok, mesmo que vocês não tenham entendido bulhufas desse blá-blá-blá psicanalítico, fica a dica que ao se tratar do recalque de alguém, a coisa é mais feia do que um transplante de rosto. Aliás, convencer um recalcado de que ele está errado sobre algo, é o mesmo que um trabalho de parto dentro de um fusca no escuro.
Um recalcado é acima de tudo, um ser patologicamente teimoso e insistente, alguém que fica batendo na mesma tecla e se nega a seguir em frente. É como se a vida da pessoa virasse uma prisão de ventre, na qual nenhum Lactopurga ou Activia pudesse dar jeito. Claro, não é novidade nenhuma que o fim de um relacionamento é dose, e realmente pode nos deixar sem rumo e tal, mas tudo é a questão do nosso foco sobre o problema. Nesse processo de elaboração do "acabou, não dá mais", ficar "putodacara" é compreensível, e até mesmo aceitável em certo casos. No entanto, recalcar-se, é o mesmo que colar um rótulo de "decadência" na testa. É praticamente assinar um atestado de óbito para nossa dignidade.
O irônico é que um recalcado nunca assume seu recalque! Tio Freud explica que isso é uma defesa do nosso subconsciente, mas não é preciso entrar nas viagens do fundador da psicanálise para se entender a mentalidade de um recalcado. Tudo gira sempre em torno do amor ressentido. Distinguir uma pessoa "putadacara" de uma recalcada é algo relativamente simples. Por mais que o assunto seja o mesmo, são notáveis suas diferenças no modo como expõem seus cotovelos doloridos. Vejam os exemplos: (nota do Sr. Apêndice: as situações e a linguagem podem variar de acordo com os sexos, mas tentei fazer os diálogos bem generalizados)
"Putadacara": Quando namorávamos, eu fiz o que pude para manter a relação. Não deu certo, foda-se! Mais uma cerveja, por favor...
Recalcada: Eu fiz de tudo para salvar a relação, e ele(a) não se importou! Por quê? Como assim só penso em mim!!!??? Vai se fuder! E me dá o telefone que eu vou ligar e discutir isso agora...
"Putadacara": Ahh... ele(a) já tá caindo na night, e já tá armando esquemão... Tudo bem, foda-se, hoje eu pego qualquer um(a) só pra dar nos dedos dele(a) e não ficar pra trás!
Recalcada: COMO ASSIM, ELE(A) VAI FICAR COM OUTRO(A)??? QUEM É ESSE(A) FDP???!!! DEVE SER UM(A) BAITA ESCROTO(A) IGUAL A ELE(A)!!! EU DE CARA? POR MIM QUE SE EXPLODAM, EU NÃO TÔ NEM AÍ... (procurando a navalha e o celular para mandar uma mensagem...)
"Putadacara": E aí, vamos sair hoje? Sei lá pra onde, o importante é sair e tomar um trago...
Recalcada: Vi no Twitter e no Orkut do Fulano(a) que eles vão sair e vão aprontar algo! Nós vamos atrás dele(a), e vamos ficar de olho! FDP!!! Ainda posta no Twitter o que vai fazer! Bem tipo daquele(a) ordinário(a)!
"Putadacara": Sim, vi com quem ele(a) anda ficando. O que eu posso dizer? Se ele(a) quer baixar o nível, o problema é dele(a). Claro que tô de cara, mas na boa, foda-se, sou mais eu. E vamos beber...
Recalcada: TU VIU COM QUEM ELE(A) ANDA FICANDO???!!! UM(A) BAITA PUTO(A), CHINELO(A), VAGABUNDO(A) DIZEM QUE ATÉ AIDS TEM... BAGACEIRO(A), CRETINO(A) É BEM A CARA DELE(A) PEGAR ESSE TIPO DE GENTE!!! EU QUERO MAIS É QUE ELES CASEM, SE CONTAMINEM E MORRAM!!! MORRAM PORQUE EU NÃO TO NEM AÍ!!! NEM AÍ, SEUS MERDAS!!! FODAM-SE OS DOIS, EU TÔ BEM MELHOR!!! HAHAHAHAHA... (riso forçado seguido de choro e/ou ataque de raiva)
"Putadacara": Sexo tá me fazendo uma falta danada...
Recalcada: Na cama a criatura era um desastre. Totalmente broxante. Era um(a) pateta, sem pegada nenhuma, mal sabia fazer um papai-mamãe! Bem, pelo menos trepei o suficiente com ele(a) a ponto de não ter mais nada o que fazer. Quem vier agora vai ter que se contentar com os restos que EU deixei...
Notem que estar "putodacara" não deixa de ser uma forma "suave" de recalque. Só que o "putodacara" não fica resmungando incessantemente sobre uma relação terminada. No caso dele, a indignação é mais forte que a frustração, então tudo é uma questão de "tocar o foda-se". No caso do recalque, a ficha pode demorar a cair. Ver o outro numa melhor, e depender disso para torturar-se é deprimente. Ah sim, esqueci de dizer, mas o recalque tem funções masoquistas. Além disso, internamente, as roupas sujas da mágoa, do ódio e da inveja podem demorar tempos para serem bem enxaguadas na lavanderia da aceitação.
E não pense que você aí, não tem uma gota de recalque dentro de si. Isso mesmo, o recalque é algo que existe em todos nós, já dizia nosso, agora mais íntimo, titio Freud. E não adianta fugir disso. Ah, você aceita tudo numa boa, não sente nada quando enfrenta o fim? Aham, você só pode ser um monge budista ou um robô. Ou um banana. Ademais, ao se tratar de um recalcado espere pelos maiores absurdos.
Pois como se não bastasse, o recalcado, além de lidar com sua dor da forma mais negativa possível, ainda arranja tempo para criar situações dignas de um circo mambembe. Já vi pessoas que em nome de seu ressentimento, fizeram coisas tão enfadonhas que deixariam os abobados do Zorra Total com vergonha. Trotes para o(a) ex no meio da madrugada, ameaças de morte, porres homéricos com direito a fiascos em lugares públicos, confissões sexuais em comunidades no Orkut, fotos do tipo "caiu na net" espalhadas por sites pornográficos, etc. Mas o "melhor", são os casos de recalcados que roubam roupas íntimas do(a) ex e levam para um terreiro, a fim de fazerem macumba, pedindo para que "Exu Não-Sei-Das-Quantas" traga a pessoa de volta (ou a destrua de vez!). O detalhe que eu não sei, é se essa cueca ou calcinha, tem que estar limpa ou suja... Bem, depende da tara do Pai de Santo. Há também um bando de malucos, que pegam fios de cabelo do(a) ex para fazerem bonequinhos de vudu. Sim, eu disse isso mesmo: bonequinhos de vudu! (Esse assunto ainda irá me render uma outra crônica no futuro...)
No mais, não tem jeito mesmo. Melhor ficarmos "putosdacara" com a condição humana, e fingirmos que conhecemos bem nosso inconsciente a ponto de nunca nos surpreendermos com ele. Pois se no amor tudo é possível, imaginem o amor recalcado? Deus nos dê forças! E apesar de vermos o seres humanos agindo feito loucos, de maneiras que nem mesmo titio Freud explica, o verdadeiro mal dessa história toda, na realidade, não é o recalque. É o amor.